Sabemos que os sentimentos vividos junto à família são muito significativos e por isto tão intensos.
Esta intensidade dos afetos chega muitas vezes a gerar confusões quanto ao que cabe a cada um realizar. É comum que seus integrantes em certas situações venham a se sentirem responsável pela felicidade do outro, muito além do que seja necessário e até mesmo possível.
Este é um sentimento difícil de ser explicado, mas que perturba e atrapalha muito quem o vivencia.
É o que sente, por exemplo, uma filha que está rodeada de amigos, frente a uma mãe que fica em casa sozinha e tem poucas amizades. O que sente muitas vezes aquele que está tendo sucesso em seu trabalho frente ao irmão que há algum tempo não tem tido oportunidades e êxito profissional.
Existe certa crença que paira no ar de que não fica muito bem se sentir tão feliz quando se está bem-sucedido, próximo de pessoas que estão em situações difíceis, ainda mais quando são pessoas tão íntimas.
Ao longo da vida nutrimos um desejo de querermos a felicidade a todos que nos rodeiam. Quando isto não acontece ficamos muito angustiado, e da angustia nasce à culpa. Como poderemos estar bem se o outro que amamos não está? Como posso usufruir minhas conquistas se aquele que amo não está em situação semelhante?
Para entendermos mais este sentimento precisamos pensar que por traz do sentimento de culpa está o sentimento de onipotência. Pois existe a tendência em se achar que se pode comandar e determinar a vida do outro. Que se pode fazer alguma coisa, algo que tire o outro daquele estado.
Quando se entende que na vida se faz escolhas e que estas levam a determinada situação e que ninguém consegue fazer pelo o outro se ele não fizer por si, se sentirá menos responsável. É necessário compreender ainda, que apesar da dor do ente querido, há também certos ganhos que ele tem com a situação, mesmo que seja muito difícil percebê-los e ainda mesmo que eles não lhe sejam saudáveis. É preciso considerar que cada um tem seu tempo para as coisas, e que o que é bom para um pode não ser exatamente o que o outro deseja. Quando estas questões são consideradas pode-se colocar ordem melhor aos sentimentos e consequentemente a culpa é amenizada.
É a maturidade de cada um que determinará o quanto que vai existir uma porta aberta para a culpa. Quanto mais madura a pessoa, melhor consegue discernir o que é de sua responsabilidade ou não, o que pode e o que não pode ser feito e aceita melhor as suas limitações frente à vida.
É necessário poder separar a vida de cada um e não misturá-la. Algumas vezes aquele que está em uma situação não tão privilegiada gostaria muito que o outro em situação melhor não se preocupasse tanto com ele, pois em determinadas situações ainda é mais um fardo para ele carregar, a culpa que sente pela culpa do outro. A preocupação que o culpado também gera.
As crises podem ser bons momentos para se repensar a vida. E muitos querem viver isto sem se sentirem estar incomodando os outros.
Novembro 2018
Texto de autoria de Rosângela Martins - Todos os direitos reservados
Psicóloga Porto Alegre
CRP 07/05917